I
De quem seria a culpa primeira senão daquele que primeiro pecou? Se a liberdade me é lícita, o perdão dispensado em larga escala e a justiça, a serva, o que foi feito de meus anseios ou devaneios enquanto dormia o Criador de todas as coisas?
De quem seria a culpa primeira senão daquele que primeiro pecou? Se a liberdade me é lícita, o perdão dispensado em larga escala e a justiça, a serva, o que foi feito de meus anseios ou devaneios enquanto dormia o Criador de todas as coisas?
Lá pelas oito da noite, como de costume, saía para o parque verde em frente sua casa. Caminhava olhando pro céu, como se de lá viesse a resposta derradeira. Outrora, aqueles caminhos a conduziam à velha casa do Senhor da Estrada. Hoje, após a destruição que em chamas deixara a velha casa, ninguém sabe, a exatos vinte anos, o paradeiro daquele que a iniciara na arte visionária de olhar para as estrelas. Agora, só vê as estrelas escondidas num breu cintilante.
II
Trinta minutos me são suficientes. A vontade está em não retornar pelo caminho traçado na ida. Como braços de rio, quero mesmo é encontrar o mar perdido no sonho dos meus instintos.
Entretanto, não fosse pelos velhos conselhos daquela jovem alma, teria eu imediatamente, feito da minha liberdade o umbral que soleira meus pecados, tão sórdidos como o mais precioso metal exposto na vitrine por onde passam os maus.
A serpente se exaltara ao se defender. Meu poder tão singelamente se apoderara do mais fiel fruto que de tão intransigente e conducente aos vales dos demônios, tão atrativo e auspicioso se demonstra.
Então, resolvi pecar.
E pequei desmedidamente, igual louco que tem a lua como bússola. Pequei por meus pais que ainda sofrem. Pequei pelos pequeninos que tão inocentemente matam. Transgressões me tiram o sono todas as noites. O meu corpo é a chama que do interior clama por prazer. Prazer que me leve ao mais suntuoso sítio. Estou ferindo os meus princípios. Mas se Deus, comedidamente ama, talvez assim condene. O preço que ando pagando exige de mim uma demanda de prioridades. Se o meu pecado te conduz ao engano, te dou o fruto ora velado para que degustes.
Meu espírito não quer retornar à casa.
Ao ver o corpo à minha frente, frio, palidamente gélido, pensei: "Que Deus o abençoe. A vida não lhe fora nenhum pouco justa!"
III
Sem nenhum constrangimento assumi diante de mim a culpa outrora esquecida pelos nossos pais. Vi diante de mim, o fruto putrefacto. Sem cor ou apetite. As vontades desaparecem diante de um corpo frio. Prazeres se diluem no lado esquerdo da cama, agora vazio. Sabores tornam-se água insalubre.
Minhas mãos se encheram rapidamente de sangue. Ao me virar, percebi a trilha deixada. Quantas atrocidades perdidas. E o velho ainda não chegara.
Meu espírito ficou em fragmentos pela estrada. Deixei-o próximo de todos aqueles que me são hostis. Nos umbrais das casas, fui sorrateiro. Onde não via a cruz estampada de vermelho, tornara-se habitat de meus demônios. Sorrateiros. Saqueiam as praças. Esta caminhada me fez relembrar frases ainda não ditas, alimentar-me do vazio inconveniente.
IV
Se pecar é deixar o corpo infringir a alma, confesso que não há nexo algum na narrativa exposta até o presente. Agora, se pecar é deixar-se invadir espiritualmente, para que eles o façam, entendo muito mais os meus delírios. Agir me permite ser. Existencialmente.
Quando a fera, austera e demente, soube que Cícero despertara em Agostinho o gosto pela filosofia, eis que suscitara nela uma fome incomum. O que é o sexo diante do mal ou bem outrora inimigos? A fome ou nudez? A fala? O gesto? Como quantificar o tanto de mal que existe aqui dentro, se o bem ainda aflora no peito?
E para corrigir tamanho erro, essencialmente moral, cria-se a graça divina. Cria-se a ausência do mal. Cria-se o livre-arbítrio.
Me permiti hoje fazer justiça. Cometer graça e dispensar liberdade. Acalentar a fera, que mesmo austera, insiste atormentar minha alma. Feri o corpo para libertá-la. Dualidade esquisita e preponderante. Ainda querem espaço em mim do que tão pouco tenho pra dar.
Meu espírito ficou em fragmentos pela estrada. Deixei-o próximo de todos aqueles que me são hostis. Nos umbrais das casas, fui sorrateiro. Onde não via a cruz estampada de vermelho, tornara-se habitat de meus demônios. Sorrateiros. Saqueiam as praças. Esta caminhada me fez relembrar frases ainda não ditas, alimentar-me do vazio inconveniente.
IV
Se pecar é deixar o corpo infringir a alma, confesso que não há nexo algum na narrativa exposta até o presente. Agora, se pecar é deixar-se invadir espiritualmente, para que eles o façam, entendo muito mais os meus delírios. Agir me permite ser. Existencialmente.
Quando a fera, austera e demente, soube que Cícero despertara em Agostinho o gosto pela filosofia, eis que suscitara nela uma fome incomum. O que é o sexo diante do mal ou bem outrora inimigos? A fome ou nudez? A fala? O gesto? Como quantificar o tanto de mal que existe aqui dentro, se o bem ainda aflora no peito?
E para corrigir tamanho erro, essencialmente moral, cria-se a graça divina. Cria-se a ausência do mal. Cria-se o livre-arbítrio.
Me permiti hoje fazer justiça. Cometer graça e dispensar liberdade. Acalentar a fera, que mesmo austera, insiste atormentar minha alma. Feri o corpo para libertá-la. Dualidade esquisita e preponderante. Ainda querem espaço em mim do que tão pouco tenho pra dar.
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